sexta-feira, 15 de julho de 2011

RECEITA DERRUBA VENDAS


A exigência de receita médica para a compra de antibióticos no Brasil reduziu significantemente os volumes de venda desses medicamentos entre dezembro e maio. A queda é da ordem de 27%, considerando a média mensal comparada a novembro, último mês antes da entrada em vigor da medida da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), que aconteceu no dia 28 daquele mês. O levantamento foi feito pelo Sindusfarma (Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos do Estado de São Paulo), a pedido do Valor, com base nos 50 principais antibióticos consumidos no país.

O maior pico de recuo nas vendas foi de 34% em fevereiro, pelo levantamento feito pelo Sindusfarma. "Foi nesse período que o governo começou a intensificar a campanha para divulgar a medida", afirmou Nelson Mussolini, diretor-executivo da entidade. "Nossa expectativa é de que as vendas comecem a se recuperar nos próximos meses", disse.

A queda nas vendas se acentua ainda mais se considerados apenas os três principais antibióticos - amoxicilina, cefalexina, azitromicina -, superando os 40%, de acordo com levantamento feito pela Anvisa, a pedido do Valor.

O segmento de antibióticos no Brasil movimenta, por ano, cerca de R$ 2,1 bilhões, segundo o Sindusfarma, com base nos dados da consultoria IMS Health.

Segundo Mussolini, os produtos de marcas fortes no mercado foram os mais prejudicados, em um primeiro momento, com essa decisão. "O impacto foi maior porque o consumidor era adepto da compra espontânea", disse.

O combate à automedicação, inerente a boa parte dos brasileiros, foi um dos principais fatores levantados pela Anvisa para impor a resolução. "Outro ponto importante é evitar a resistência aos microbianos", disse Carmem Oliveira, gerente-geral em tecnologia da saúde da Anvisa. "O uso irracional de certos medicamentos promove resistência a certos princípios ativos", avisa.

Embora não haja um levantamento oficial do impacto da medida nas vendas do varejo farmacêutico, laboratórios e redes de farmácia consultadas pelo Valor já sentem, na prática, o peso da resolução da Anvisa no caixa.

A EMS, um dos maiores laboratórios nacionais de medicamentos genéricos do país, confirma o que os levantamentos informais indicam. "O recuo é mais acentuado em genéricos. Houve redução sim, mas não temos dados exatos", afirmou Waldir Eschberger, vice-presidente de mercado da farmacêutica nacional. "Respeitamos a decisão da Anvisa. Diminui a automedicação, mas acho que tem um lado negativo, que é a interrupção da continuidade do tratamento para pacientes que não possuem plano de saúde privado", disse. Segundo ele, como a marcação de consultas pelo SUS (Sistema Único de Saúde) é mais demorada, se comparada com os planos privados, muitos pacientes deixam de ir ao médico para dar continuidade ao tratamento.

Francisco Deusmar de Queirós, fundador da rede Pague Menos, a maior do país, também não tem números oficiais, mas afirmou que as vendas desses medicamentos em sua rede caiu, em média, cerca de 25%.
A Anvisa observou que a obrigatoriedade de exigência da receita ocorre desde os anos 1970. No ano passado, a agência publicou medida mais restritivas para fazer valer a lei, a RDC nº 20/2011. Por essa resolução, a segunda via da receita fica retida na farmácia e a primeira via volta para o paciente, mas carimbada para evitar que seja usada novamente. O prazo de validade dessa receita é de dez dias, a partir da data da prescrição. Por lei, também foram estabelecidas adequações de embalagem e bula desses produtos que ainda não estão em vigor.

Segundo Mussolini, os laboratórios são a favor dessa resolução por dar segurança à farmácia e às indústrias. "O medicamento é utilizado exatamente da forma como o laboratório e o médico preconizaram", afirmou.

Procurado pelo Valor, Sérgio Mena Barreto, presidente da Abrafarma (Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias), informou que suas associadas não possuem um balanço oficial da queda das vendas desse medicamento. As redes Drogaria São Paulo e Droga Raia também foram procuradas, mas preferiram não comentar o efeito da resolução nas vendas de seus estabelecimentos.

Mas com "Jeitinho"....

Boa noite. Tem amoxicilina?

- Amoxicilina? Para criança ou para adulto? Você tem receita?

- Humm... Não tenho....

- É que agora para esses remédios [antibióticos] precisa receita. Você sabe a dosagem? Vou tentar te ajudar.

- Não sei a dosagem... É para criança de 2 anos.

- Vou te indicar o de 250 mg [sai e busca o remédio]. Esse é suficiente para 10 dias.

- Muito obrigada!

O diálogo acima ocorreu na segunda-feira, dia 11, por volta das 21h, entre a reportagem e um balconista de uma farmácia independente na Zona Oeste de São Paulo. O Valor procurou outras quatro drogarias, mas não conseguiu comprar o medicamento sem receita. O objetivo foi mostrar que, apesar da exigência estar em vigor há mais de sete meses, ainda é possível furar o bloqueio e burlar a lei.

A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) informou que o estabelecimento que descumprir a exigência de pedir a receita para a venda do antibiótico sofrerá punição, que vai desde advertência, interdição e multa - de R$ 2 mil a R$ 1,5 milhão. Esses valores variam de acordo com o porte da empresa e a apuração da infração. A venda de medicamento controlado exige uma autorização específica para a farmácia ou drogaria. Ou seja, nem toda farmácia pode comercializar medicamento controlado. O país conta com cerca de 62 mil farmácias. As 26 maiores redes nacionais respondem por 6% do total de estabelecimentos.

A fiscalização nas farmácias em todo país é realizada pelas vigilâncias sanitárias locais. Segundo a Anvisa, denúncias de venda irregular podem ser feitas a essas vigilâncias locais ou à própria agência pelo telefone 0800- 642-9782. (MS)

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